Avaliação do zumbido por imagem

A tomografia computadorizada e a ressonância magnética auxiliam o diagnóstico.

O zumbido é a sensação de som na ausência de estímulo sonoro externo correspondente. Há uma extensa lista de fatores que causam a condição, porém vamos abordar, nesta oportunidade, as possíveis etiologias identificadas pelos exames de imagem.

Existem muitas classificações descritas para o zumbido, que pode ser considerado, por exemplo, objetivo, se o som também é audível pelo examinador, ou subjetivo, sua forma mais comum, quando não se associa a um som específico interno. Também é dividido em pulsátil, com som perceptível com o batimento sincrônico do coração, e para o qual o exame neurovascular pode ser indicado, e em não pulsátil, mais frequente, cuja diferenciação varia conforme duração, sintomas concomitantes e fatores causais.

A subdivisão do zumbido pulsátil é ampla na literatura e engloba causas metabólicas, vasculares e estruturais. Enquanto as metabólicas incluem medicamentos e aspectos que determinam aumento do débito cardíaco, as estruturais são menos frequentes e se relacionam a neoplasias e a uma série de outras anomalias do osso temporal, como displasias e tumores vascularizados. As causas vasculares, por sua vez, são classificadas em arterial, venosa e mista.

Zumbido pulsátil relacionado a causas vasculares

Causas Ateriais: 

  • Estenose;
  • Dissecção;
  • Displasia fibromuscular;
  • Aneurisma;
  • Artéria estapediana persistente (figura 1);
  • Artéria carótida interna aberrante (figura 2);
  • Alça vascular que desloca o segmento cisternal do nervo vestibulococlear (figura 3).

Figura 1:  Paciente com zumbido pulsátil à esquerda, com artéria estapediana persistente. Em 1A, imagem de TC axial filtro ósseo demonstra esta estrutura vascular junto ao estribo esquerdo (seta). Em 1B, em imagem de TC filtro ósseo com reconstrução coronal, observa-se a estrutura com curso a partir da carótida interna, com extensão pelo promontório coclear (seta pequena) e estribo até o segmento timpânico do nervo facial, que está alargado (seta grande).

Figura 2 : Artéria carótida interna esquerda aberrante. Imagem de TC axial filtro ósseo demonstra esta artéria (seta) que se estende pela orelha média junto ao promontório coclear, associada a alargamento do canalículo timpânico inferior. O sintoma mais comum é o zumbido pulsátil.

Figura 3 ;Paciente com zumbido à direita. Em 3A, imagem de RM sequência T2 volumétrica no plano axial, e, em 3B, no plano coronal, demonstram a artéria cerebelar anteroinferior direita promovendo deslocamento posteroinferior do nervo vestibulococlear na cisterna cerebelopontina, próximo à sua emergência (setas). A compressão vascular do nervo vestibulococlear deve ser relacionada com a clínica, pois pode ser encontrada em pacientes assintomáticos.

Causas Venosas

Comuns no contexto de zumbido pulsátil, são benignas e, por vezes, não tratáveis, visto que a relação causa-efeito não é robustamente demonstrada e necessita de uma correlação clínica individual e parcimoniosa. Exemplos:

  • Dominância da veia jugular interna e do seio sigmoide;
  • Estenose relacionada à compressão extrínseca do segmento supra-hióideo da veia jugular interna pelo processo transverso de corpo vertebral, pelo processo estiloide ou mesmo pelo ventre posterior do músculo digástrico;
  • Bulbo jugular alto, com divertículo jugular e deiscência do bulbo com o assoalho do hipotímpano (figura 4);
  • Deiscência da placa sigmóidea e divertículo do seio sigmoide (figura 5);• Estenose da veia jugular interna ou de seio venoso dural (figura 6);
  • Canal venoso aberrante e veia emissária proeminente (figura 7)

Causas vasculares mistas

  • Malformação arteriovenosa;
  • Fístula arteriovenosa dural (figura 7).

Figura 4: Paciente com zumbido à esquerda. Em 4A, imagem de TC filtro ósseo em reconstrução coronal demonstra bulbo jugular esquerdo alto, com deiscência do assoalho do hipotímpano (seta). Em 4B, imagem de TC filtro ósseo em reconstrução coronal discretamente mais posterior que 4A demonstra no mesmo paciente divertículos jugulares (setas). Aqui há outro exemplo da necessidade de correlação clínica, uma vez que tais achados podem ser encontrados em pacientes assintomáticos.

Figura 5: Paciente com zumbido pulsátil à esquerda. Em 5A, imagem de RM sequência T1 com saturação de gordura e após administração endovenosa do gadolínio no plano axial, demonstra o seio sigmoide esquerdo proeminente e lateralizado (seta). Em 5B, imagem de TC axial filtro ósseo caracteriza melhor esses achados, bem como a deiscência óssea da placa sigmóidea com as células da mastoide adjacentes (seta). Em 5C, imagem de RM reconstrução 3D da sequência de angio-RM evidencia hipoplasia dos seios sigmoide e transverso direitos e a consequente proeminência do seio sigmoide esquerdo (seta).

Figura 6: Em 6A, imagem de RM axial T2 SE; em 6B, imagem de RM coronal T2 SE; em 6C, imagem de RM sequência T2 volumétrica no plano axial. As setas nas imagens demonstram estenose dos seios durais decorrente da herniação do parênquima cerebelar para o interior dos seios sigmoides neste paciente com zumbido.

Figura 7: Fístula arteriovenosa dural em paciente com zumbido pulsátil à esquerda. Em 7A, imagem de TC axial filtro ósseo mostra alargamento de veia emissária esquerda (seta), achado que isoladamente depende de correlação clínica. Em 7B, imagem de TC axial filtro ósseo em nível superior à 7A, nota-se deiscência da placa sigmoide esquerda (seta). Em 7C, imagem de RM com reconstrução 3D da sequência de angio-RM venosa evidencia falhas de enchimento no terço lateral do seio transverso esquerdo (seta). Em 7D, imagem de angio-RM arterial sequência TOF, evidencia várias estruturas vasculares arteriais junto ao seio sigmoide (seta pequena), inclusive com trajeto pelo osso occipital até as partes moles extracranianas (setas grandes). EM 7E, imagem de RM reconstrução 3D da sequência de angio-RM TOF evidencia as mesmas alterações.

Características dos principais exames de imagem na investigação do zumbido

Angiotomografia computadorizada arterial e venosa

  • Avalia a dinâmica do fluxo sanguíneo com as estruturas ósseas da calota e da base do crânio (incluindo os ossos temporais), assim como do pescoço. 
  • Identifica variações anatômicas e doenças.

Angiorressonância magnética arterial e venosa

  • Pode detectar causas vasculares com alta acurácia. 
  • Apesar de não emitir radiação ionizante, o tempo de aquisição das sequências é longo e o exame apresenta menor sensibilidade para a avaliação óssea.

Ressonância magnética das mastoides

  • É mais sensível para estudar a lesão expansiva retrococlear.
  • Avalia lesões expansivas na orelha média e no forame jugular.
  • Permite estudar a cóclea, o vestíbulo e os canais semicirculares.
  • Possibilita a execução de um protocolo específico para a doença de Ménière.
  • Avalia o nervo vestibulococlear e possíveis compressões.

Tomografia computadorizada do osso temporal

  • É apropriada para identificar a etiologia vascular e lesões expansivas na orelha média.
  • Está indicada também para a avaliação óssea de variações anatômicas venosas e arteriais em mastoides, doenças da orelha média, displasia óssea e deiscência de canal semicircular, sobretudo do canal semicircular superior.

Ressonância magnética do crânio

  • Trata-se do melhor método para o estudo das lesões encefálicas desmielinizantes e de pequenos vasos (microangiopatia), bem como para a identificação distúrbios da circulação liquórica.


Quando os sintomas ajudam a direcionar o diagnóstico

Os zumbidos pulsátil e não pulsátil podem estar associados a outros sintomas e sinais clínicos, tais como perda auditiva condutiva ou neurossensorial, sintomas vestibulares e neurológicos. O conjunto dessas manifestações sinaliza a suspeita de possíveis etiologias, como as discriminadas no quadro a seguir.

SINAIS CLÍNICOS ASSOCIADOS
POSSÍVEIS ETIOLOGIAS
Vertigem
Doença de Ménière (figura 8), deiscência do canal semicircular e doença do sistema vestibular
Perda auditiva neurossensorial
Doenças retrococleares, como o schwannoma vestibular (figura 9)
Perda auditiva condutiva
Doenças da orelha média (figura 10), disfunção tubária e otosclerose
Cefaleia
Hipertensão intracraniana, distúrbios da circulação do liquor e anormalidades craniocervicais
Sintomas neurológicos
Doenças desmielinizantes e cerebrovasculares
Dor cervical e na articulação temporomandibular (ATM)
Alterações degenerativas nas ATM (figura 11)


Figura 8: Paciente com doença de Ménière com tontura, perda auditiva e zumbido à esquerda. Em 8A, imagem de RM FLAIR 3D após 4 horas da administração EV do gadolínio, com protocolo específico identifica realce mais acentuado da cóclea esquerda (seta). Em 8B, imagem de RM FLAIR 3D após 4 horas da administração EV do gadolínio evidencia discreto aumento do sáculo esquerdo (seta), que tem dimensões semelhantes ao utrículo adjacente. Tais achados denotam hidropsia endolinfática.

Figura 9: Schwannoma vestibular em paciente com zumbido à direita, porém sem perda auditiva. Em 9A, imagem de RM sequência T1 volumétrica após administração EV do gadolínio no plano axial, evidencia nódulo com realce pelo contraste (seta) no fundo do conduto auditivo interno direito, junto à abertura coclear. Em 9B, imagem de RM sequência T2 volumétrica no plano axial, demonstra falha de enchimento (seta) na topografia da lesão no fundo do conduto auditivo interno direito. A estabilidade dos achados nos exames de controle sugere schwannoma vestibular.

Figura 10: Perda auditiva condutiva, plenitude aural e zumbido pulsátil à direita. Em 10A, imagem de TC axial filtro ósseo mostra preenchimento inespecífico da cavidade timpânica direita (seta). Em 10B, imagem de RM axial T2 SE permite identificar um nódulo com hipossinal em T2 (seta) localizado junto ao promontório coclear. Em 10C, imagem de RM axial T1 com saturação de gordura e após administração endovenosa do gadolínio evidencia realce da lesão no promontório, denotando natureza sólida. O conjunto dos achados é compatível com pequeno glomus timpânico.

Figura 11: Imagem de TC filtro ósseo em reconstrução sagital evidencia alterações degenerativas na articulação temporomandibular, caracterizada por irregularidade dos contornos ósseos articulares, esclerose, cistos subcondrais e osteofitose marginal, com redução do espaço articular.

Abreviações utilizadas:

  • TC - tomografia computadorizada
  • RM - ressonância magnética 
  • SE - spin echo 
  • TOF - time of flight
  • EV - endovenoso


Consultoria médica:

Dr. Bruno Casola Olivetti - Consultor médico em Neuroimagem
[email protected] 

Dr. Carlos Jorge da Silva - Consultor médico em Neuroimagem
[email protected] 

Dr. Carlos Toyama - Consultor médico em Neuroimagem
[email protected] 


Referências 

Kang, M. and E. Escott (2008). “Imaging of tinnitus.” Otolaryngol Clin North Am 41(1): 179-193, vii.

Kessler, M. M., M. Moussa, et al. (2017). “ACR Appropriateness Criteria((R)) Tinnitus.” J Am Coll Radiol 14(11S): S584-S591.

Kumar, R., S. Rice, et al. (2021). “Detecting causes of pulsatile tinnitus on CT arteriography-venography: A pictorial review.” Eur J Radiol 139: 109722.

Langguth, B., P. M. Kreuzer, et al. (2013). “Tinnitus: causes and clinical management.” Lancet Neurol 12(9): 920-930.

Lynch, P., T. Mitton, et al. (2022). “Diagnosing Pulsatile Tinnitus: A Review of 251 Patients.” Otol Neurotol 43(1): 128-136.

Narsinh, K. H., F. Hui, et al. (2022). “Diagnostic Approach to Pulsatile Tinnitus: A Narrative Review.” JAMA Otolaryngol Head Neck Surg 148(5): 476-483.