Medicina nuclear

Tópicos presentes neste capítulo

  • Generalidades  

Generalidades

A Medicina Nuclear vem sendo usada há alguns anos no diagnóstico e acompanhamento das mais diversas patologias neurológicas.

Utilizando-se diferentes radiofármacos e técnicas de aquisição de imagem é possível avaliar-se vários aspectos da fisiologia cerebral, destacando-se a perfusão sanguínea, o consumo de glicose, a atividade mitocondrial, o fluxo liquórico, entre outros, com valor tanto na prática clínica como científica.

As técnicas de aquisição de imagem passaram por grandes transformações e atualmente a maioria dos serviços de medicina nuclear utiliza a tomografia por emissão de fóton único (SPECT - single photon emission tomography) para a realização dos exames, sendo as imagens planas utilizadas em algumas poucas situações ou em caráter complementar às técnicas tomográficas - vale lembrar que nos últimos anos a utilização das técnicas de tomografia por emissão de pósitrons (PET) tem aumentado muito na prática clínica, e podem ser de muita utilidade em algumas indicações específicas.

Na prática clínica, os radiofármacos que mais têm sido usados são aqueles relacionados à avaliação da perfusão sanguínea cerebral (ECD-Tc99m e HMPAO-Tc99m), utilizando-se a SPECT como técnica de aquisição da imagem (Figura 1). O estudo da perfusão sanguínea cerebral é muito útil na avaliação de algumas patologias cerebrais como: doenças vasculares, demências, epilepsias, entre outras. No Brasil, devido à disponibilidade e ao preço usa-se preferencialmente o ECD-Tc99.

  

Figura 1: SPECT cerebral utilizando como radiofármaco o ECD-Tc99m para a avaliação da perfusão sangüínea. Observa-se distribuição homogênea do radiofármaco por todo o córtex cerebral, núcleos da base e cerebelo.

O metabolismo cerebral, principalmente o consumo de glicose, pode ser avaliado utilizando-se como radiofármaco a 18-FDG (um análogo radioativo da glicose) e a PET (Figura 2). Este tipo de exame pode ser útil no diagnóstico diferencial de recidiva tumoral e radionecrose, no diagnóstico diferencial das demências e na localização de foco epiléptico; infelizmente, esta ainda é uma metodologia cara e pouco difundida em nosso meio.

  

Figura 2: PET cerebral utilizando como radiofármaco a 18-FDG, um análogo radioativo da glicose, para a avaliação de metabolismo. Observa-se distribuição homogênea do radiofármaco por todo o córtex cerebral e núcleos da base.

No caso específico dos quadros demenciais, os métodos cintilográficos, tanto pela técnica de SPECT como pela PET, podem apresentar padrões de captação que ajudam a estabelecer as diferentes causas deste distúrbio. Nas demências de origem vascular pode-se encontrar áreas de hipocaptação dispersas pelo parênquima cerebral correspondendo aos territórios infartados (Figura 3). Nas demências frontais, a hipocaptação se localiza predominantemente nos lobos frontais e na porção anterior dos lobos temporais (Figura 4). Na demência de Alzheimer, o padrão considerado provável para a patologia é a hipocaptação parieto-temporal bilateral (Figura 5), no entanto outras patologias como a demência do Parkinson e a demência por corpos de Lewis, podem mostrar padrão semelhante a este.

  

Figura 3: Cortes transversais de SPECT cerebral com ECD-Tc99m mostrando distribuição heterogênea do radiofármaco no córtex cerebral, com áreas de hipocaptação acentuada em regiões temporal e parietal direitas, e núcleos da base ipsilateral (ver ponta de seta). O padrão observado é sugestivo de lesão isquêmica nestas regiões.

  

Figura 4: Cortes transversais de SPECT cerebral com ECD-Tc99m mostrando hipocaptação do radiofármaco em regiões frontais. Este padrão é sugestivo de demência frontal.

  

Figura 5: Cortes transversais de SPECT cerebral com ECD-Tc99m mostrando hipocaptação do radiofármaco em regiões parieto-temporais bilaterais (ver pontas de setas). Este padrão é considerado provável para doença de Alzheimer.

Nos quadros de epilepsia, tanto os métodos cintilográficos utilizando SPECT como aqueles utilizando a PET, são úteis na localização do foco, sendo métodos considerados complementares às outras técnicas utilizadas com esta finalidade. Imagens da perfusão cerebral utilizando SPECT podem ser realizadas na fase ictal, quando se espera aumento da perfusão sanguínea para o foco de origem, ou na fase interictal, quando se espera diminuição da perfusão no foco. A técnica ictal é mais sensível e específica do que a técnica interictal, no entanto tem como principal inconveniente a necessidade de internação e monitorização do paciente, a fim de se injetar o radiofármaco no momento da crise.

Além dos já citados, outros exames utilizando radiofármacos são de grande utilidade na prática clínica da neurologia como, por exemplo, a avaliação de recidiva tumoral e a caracterização de massas cerebrais utilizando-se SPECT com MIBI-Tc99m (um marcador relacionado ao metabolismo mitocondrial) (Figuras 6 e 7) ou Tálio (relacionado à atividade da bomba de sódio e potássio); e a avaliação do fluxo liquórico, pela injeção de radiofámacos intratecais, técnica de grande utilidade na avaliação de fístula liquórica, no diagnóstico de hidrocefalia de pressão "normal" (Figura 8) e na caracterização de cistos de aracnóide (Figuras 9 e 10).

  

Figura 6: Cortes transversais e coronais mostrando a distribuição normal do MIBI-Tc99m no cérebro. Nota-se captação no escalpe e no plexo coróide.

  

Figura 7: SPECT cerebral com MIBI-Tc99m mostrando captação anômala em região parietal esquerda. A biopsia da lesão mostrou recidiva tumoral nesta localização. Ao contrário do ECD-Tc99m, que é captado normalmente no córtex cerebral, o MIBI-Tc99m não é captado em situações normais.

  

Figura 8: Imagens planas em projeção anterior de exame de cisternocintilografia mostrando a entrada progressiva do radiofármaco nos ventrículos laterais (setas). Esta imagem é considerada sugestiva de hidrocefalia de pressão normal.

  

Figura 9: Imagem de tomografia computadorizada de crânio mostrando formação cística em região fronto-parietal direita.

  

Figura 10: Imagens da cisternocintilografia obtidas 1, 6 e 24 horas após a injeção do radiofármaco no espaço liquórico mostrando chegada progressiva do radiofármaco na formação cística descrita na tomografia computadorizada de crânio (Figura 9).

Desta forma, a medicina nuclear tem contribuído para o diagnóstico de diversas patologias neurológicas, e esta contribuição tende a aumentar ainda mais com o barateamento e a difusão dos recentes avanços tecnológicos que ocorreram na especialidade.

Atualmente, no Fleury, os seguintes exames de medicina nuclear são realizados rotineiramente para avaliação de patologias neurológicas: