A reação de amplificação em tempo real, uma variante da reação de PCR convencional, representa grande avanço nos métodos moleculares de auxílio diagnóstico, particularmente por facilitar sobremaneira as tarefas de quantificação da expressão gênica em determinado tecido ou amostra biológica. Um exemplo muito bem conhecido é o da leucemia mielóide crônica (LMC), que apresenta de maneira constitutivamente elevada a expressão do transcrito BCR-ABL. Esse gene quimérico, produto da fusão dos genes BCR e ABL, pode não apenas ser detectado, firmando o diagnóstico da doença mieloproliferativa, mas ter seu nível de expressão aferido ao longo de determinada intervenção terapêutica. Dessa forma, constitui excelente marcador para avaliar precocemente a resposta da LMC ao tratamento. O método utiliza um sistema fluorescente em plataforma capaz de detectar a luz oriunda da reação de amplificação. As figuras abaixo apresentam, de forma esquemática, uma dessas abordagens fluorescentes, qual seja, a da utilização da atividade 5' exonuclease da Taq DNA polimerase em sondas marcadas com corantes fluorescentes (TaqMan). Essas sondas, específicas para o segmento gênico cuja expressão se deseja estudar, apresentam uma substância (fluoróforo na posição 5' da sonda) capaz de absorver a energia luminosa emitida pelo equipamento e dissipá-la na forma de luz e calor, em comprimento de onda diferente do original (figura 1). Entretanto, na sua posição nativa, toda a luz emitida por esse fluoróforo é absorvida por substância (quencher) presente na extremidade 3' da sonda. Dessa forma, o sistema óptico do equipamento não é capaz de detectar fluorescência no tubo de reação. Por outro lado, se a reação for capaz de gerar produtos (amplicons), ou mais precisamente, no exemplo da LMC, se for detectado e amplificado o BCR-ABL, a sonda irá hibridizar-se com esse alvo gerado e ficará exposta à atividade de exonuclease da polimerase. Como conseqüência, essa sonda será degradada e o fluoróforo ficará distante do quencher que agora não mais será capaz de absorver a luz emitida (figura 2).
O equipamento utiliza uma fonte de luz capaz de excitar o fluorocromo envolvido na reação. A fluorescência eventualmente produzida pela amostra é detectada pelo sistema e o momento da reação de PCR em que a fluorescência de determinada amostra é detectada inequivocamente acima do ruído de fundo (background) é comumente denominado de CT ou CP (threshold cycle, crossing point), como ilustra a figura 3 a seguir:
Figura 3: Curvas de monitoramento de fluorescência que ilustram a amplificação em tempo real. O nível de fluorescência computado para cada amostra é aquele suficiente para atingir um limiar (traço horizontal azul) de detecção igual para cada conjunto de primers/amostras testado e por convenção denominado de CT. A figura mostra cinco conjuntos de primers e uma única amostra. Para cada conjunto de primers os testes foram realizados em duplicadas. A fluorescência emitida antes do nível do CT para cada curva é considerada ruído de fundo (background).
Nessa nova situação, a cada estímulo luminoso gerado pelo equipamento corresponderá uma segunda emissão de luz pelo fluoróforo. Portanto, a emissão de luz será proporcional à quantidade de produto gerado no tubo de reação. Esse é, por sua vez, proporcional à quantidade inicial de alvos da reação de amplificação.
Figura 1: Representação esquemática da sonda TaqMan. R: reporter ; Q: quencher.
Figura 2: À medida que a reação de amplificação ocorre, a enzima Taq DNA polimerase cliva e sonda TaqMan, permitindo a emissão de luz.
Em casos de pacientes com LMC, ao diagnóstico espera-se maior quantidade de seqüências-alvo no início da reação, favorecendo precocemente a elevação da emissão de luz, quando comparados a pacientes em remissão citogenética. O teste descrito pode permitir a quantificação absoluta da seqüência alvo (bcr-abl) na amostra biológica. Para isso é necessária a construção de curva-padrão de amplificação, que pode ser obtida pela clonagem do segmento específico em plasmídeo bacteriano e diluição seriada dessa solução em diferentes tubos para análise por PCR. Correlacionando-se a concentração de DNA (em número de cópias) com o momento em que a quantidade de luz de cada tubo atinge o CT, obtém-se a curva mostrada na figura abaixo (figuras 3 e 4).
Figura 4a: Curva-padrão de amplificação para cálculo do número absoluto de moléculas de BCR-ABL presente na amostra testada.
Figura 4b: Curva-padrão de amplificação para cálculo do número absoluto de moléculas de BCR-ABL presente na amostra testada. Esse gráfico é construído com os dados oriundos da figura 4a, utilizando-se para isso a quantidade de moléculas por tubo (abscissa) e o CT de cada amostra (ordenada).
Uma maneira comum de revelação fluorescente do produto amplificado consiste na utilização do agente SybrGreen I, que se liga de maneira inespecífica ao DNA em fita dupla, como esquematizado na figura abaixo.
Figura 5: representação da molécula de Sybr Green (em azul) intercalada na dupla fita de DNA.
O princípio do método está baseado na detecção de fluorescência no tubo de reação à medida que DNA dupla fita é gerado, em virtude da concentração do corante SybrGreen I entre as cadeias de DNA geradas. A presença de DNA em fita dupla na solução é capaz de aumentar essa emissão de luz em cerca de 100 vezes para uma mesma concentração de SybrGreen I. Ambos os sistemas de emissão de luz (sonda TaqMan e Sybr Green) podem ser utilizados para detecção e quantificação em PCR em tempo real. TaqMan aumenta a especificidade da reação, mas apresenta um maior custo pela utilização de um oligonucleotídeo modificado além dos primers habituais para PCR. Sybr Green é agente inespecífico e revela qualquer dupla fita gerada na reação de amplificação. Em decorrência desse fato, os ensaios que utilizam esse agente devem ter desenho cauteloso para evitar-se possíveis resultados espúrios.